Por: Luciana Salomão* Muhammad Yunus e o seu banco Grameen, ganhadores do prêmio Nobel da Paz em 2006, encontraram através do microcrédito um instrumento de redução da pobreza, conscientizando a sociedade de que o “crédito deve ser aceito como um dos itens dos direitos humanos.” Com seu sistema de distribuição de crédito para os mais pobres dentre os pobres e com a sua metodologia de garantia “Aval Solidário” (pequeno grupo de pessoas que se co-responsabilizam pelo pagamento de seus empréstimos) o Grameen alcançou mais de 12 milhões de famílias carentes e a cada ano 5% delas saem da linha da pobreza (entrevista de Yunus em 2003 ao jornal Estado de São Paulo). A experiência do Grameen Bank inspirou o surgimento de instituições e programas de microcrédito similares em 58 países distribuídos na Ásia, África e América Latina, entre eles o Brasil. Hoje seu banco conta com 6,5 milhões de clientes, sendo 97% mulheres, principalmente porque elas priorizam o investimento dos recursos financeiros no bem estar da família. No total o banco possui uma carteira de 6 bilhões de dólares distribuídos em toda Bangladesh e com um índice de inadimplência de 2% (dados Grameen Bank 2007). Na América Latina e Caribe o microcrédito também está sendo utilizado como um instrumento importante na mudança do cenário sócio-econômico. Através da penetração direta em seu público-alvo e da concessão de crédito a microempreendedores formais e informais (a grande maioria), o setor de microfinanças já representa percentuais relevantes no PIB desses países. O Brasil, segundo o Bird, é o país na América Latina onde o microcrédito representa o menor percentual de atuação: apenas 2% dos clientes potenciais. Temos muitos modelos de sucesso que atuam no país há anos e que vem provando que o desenvolvimento social também é possível através do microcrédito. Bons exemplos são os programas Crediamigo, Porto Sol, Banco do Povo, CEAPE, Viva Cred entre outros. Na maioria destes programas, com base no modelo de Yunus, a viabilidade do crédito ao cliente é estudada caso a caso através de um agente de crédito e, na falta de garantias reais, se aceita a garantia solidária. Os empréstimos são individuais com análise do negócio do cliente, onde o solicitante deve atender como requisito básico trabalhar por conta própria no mínimo de seis meses há um ano. (Microcrédito - livro Construindo a Cidadania). Então o que está faltando? No Brasil aproximadamente 70% da população está excluída totalmente do sistema bancário, se incluirmos neste grupo também os que tem acesso somente a conta poupança o número de excluídos chega a 85% . (Microcrédito - livro Construindo a Cidadania). Será que não estamos seguindo as lições de Yunus e nos esquecendo da essência do microcrédito? Apesar das dificuldades de implementação e das tentativas do governo através de novas medidas provisórias, o alcance do microcrédito em uma escala significativa de forma sutentável ainda não foi alcançado. Talvez medidas como; • conhecer o universo dos clientes potenciais de baixíssima renda, estando mais próximos das comunidades atendidas com agentes de crédito das próprias comunidades , de forma a diminuir a chance de inadimplência; • conceder crédito para o mais pobre dentre os pobres e aos microempreendedores informais; desburocratizando processos; • e entender melhor o funcionamento e a gestão das organizações de microcrédito identificando nossas diferenças culturais e regionais possam ser passos necessários no caminho para fazer do microcrédito um sucesso no combate à pobreza também no Brasil. * Luciana Salomão é Administradora e Contadora com MBA em Gestão e Empreendedorismo Social (USP/SP), doze anos de experiência na área financeira e a seis anos atuante no Terceiro Setor. Consultora Social, desenvolveu o capítulo sobre microcrédito do livro Construindo a Cidadania (2005).